quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Lagoa



Já não existem mais serenatas. Aos sábados cada um pegava o seu violão e saíamos para a noite de seresta. Eu estudava música erudita, razão porque não gostava de emprestar meu violão. Não por possessão, mas por cuidado, pois o instrumento era e continua sendo de boa qualidade. Mesmo assim passava de mãos e mãos para meu desespero.

Naqueles anos dourados estudava-se música no curso ginasial. Onze matérias compunham a grade do curso. Diz-se que o mundo está evoluindo. De fato está, mas em alguns setores transparece que a evolução não está presente. A grade curricular do curso que substituiu o ginasial não é a mesma. Regrediu. Pelo menos a música foi suprimida.

Na época de faculdade nos reuníamos para tocar violão e cantar. Zé Eduardo compôs uma canção com uma letra interessante. O refrão era o seguinte: garoa na lagoa sapo canta a toa. Lá na lagoa tem um sapo inteligente, quando canta encanta gente e começa a magicar. Vou para o terreiro, acendo um cigarro de palha, apago minhas falhas, fico ouvindo sapo cantar.

O ditado popular diz: sapo de fora não chia, mas é bom ficar ouvindo o sapo cantar e tirar proveito. Fica a saudade das serestas, do curso ginasial e dos sapos a coachar no lago que o prefeito Renato Cordeiro construiu para celebrar o cinquentenário da centenária Birigui.

No lugar do lago, que além de ter sido um cartão postal da cidade, que também proporcionava aumento da umidade relativa do ar, existe uma praça. Praça que causa mais transtornos do que benefício. Melhor teria sido preservar o meio ambiente, deixando o lago bem cuidado e com peixes.

Por falar em lago, no bairro Jardim do Lago não tem mais lago. Nem lagoa. Por que os governantes não preservam as lagoas, os córregos ou qualquer curso de água? Talvez para facilitar os loteamentos em suas próprias terras. Leis existem, mas é tão fácil driblá-las.

Algumas lagoas secaram. Uma, porém, foi criada. Existe uma lagoa que recebe água todo instante. Não é bem água. É esgoto. Finalmente a lagoa de tratamento de esgoto começou a funcionar. Com tão pouco tempo de funcionamento a lagoa já está mostrando a que veio. As águas do Ribeirão Baixote estão mais claras. Já é possível enxergar o leito. Peixe ainda não tem, mas a natureza se encarregará deste feito. Em breve será possível pescar. Certamente melhor do que nada.

Pobre não tem escolha. Ou cobre o pé ou cobre a cabeça. Se puxar o cobertor para cobrir a cabeça, os pés ficam descobertos. É desta forma que está funcionando a lagoa. Despoluiu as águas do Baixote, mas todo o odor exalado pela lagoa está contaminando a atmosfera.

Por que será que os pensadores eleitos pelo povo para gerir a administração pública não consultam profissionais que entendem de tratamento de esgoto antes de realizar uma obra desta dimensão?

A predominância do vento de superfície é de leste para oeste. A lagoa de tratamento foi construída numa imensa área com alguns alqueires exatamente no ponto cardeal leste do município de Birigui. O vento passa por lá e traz para a área urbana todo o odor do esgoto.

Existem processos de tratamento de esgoto anaeróbico, onde o esgoto a ser tratado não tem contacto com a atmosfera. Este processo ocupa área com poucos metros quadrados e são instalados em vários pontos da cidade. Limpam a água e não polui a atmosfera. Outro fator muito importante é a utilização da atual rede de esgoto, dispensando a construção de tubulação do emissário até a lagoa. Isto é evolução.

De quem será o mérito da construção da Estação de Tratamento de Esgoto? Certamente do prefeito que concluiu a obra. Obra com duplo sentido. Pode ser a construção da lagoa. Pode ser aquilo que os bebês fazem em nossos colos sem perguntar se pode.

Melhor ter uma lagoa com garoa para ouvir o sapo coachar. O mundo está evoluindo, mas em alguns setores transparece que a evolução não está presente.