sábado, 26 de março de 2011

Sujou

Quando a polícia chega ao local onde os bandidos estão cometendo algum tipo de delito, a sentinela do bando pronuncia a palavra comando para iniciar a retirada: sujou. Então o refrão daquela música se concretiza. “Se gritar pega ladrão, não fica um meu irmão”.

Parece uma antítese. A Lei da Ficha Limpa sujou para muita gente que vive da política partidária e daqueles que aceitam as migalhas que caem da mesa dos poderes constituídos. Parece antítese, mas não é. Ninguém vai fugir em disparada. Esta lei será como tantas outras. Não serve para nada. Não serve porque existe a Justiça para conceder liminares a favor de quem pedir.

Lealdade é uma palavra que existe. É um substantivo feminino. “Fidelidade aos comprimidos assumidos, respeito aos princípios e regras que norteiam a honra e a probidade, caráter do que é inspirado por este respeito ou fidelidade.” Talvez este princípio de lealdade tenha motivado os ministros do Supremo Tribunal Federal a anular a Lei da Ficha Limpa.

Há algum tempo escrevi um artigo sobre a figura do prático. Em tempos passados existiam os práticos em farmácia. O mais lembrado era o dentista-prático. Não era formado, mas exercia a profissão.

Algumas profissões não exigem curso superior. Uma destas profissões é o prático responsável por conduzir os navios de grande porte do largo de Santos, passar pelo estuário e atracar. Escritor também.

Entretanto, os práticos mais famosos do Brasil são os ministros do Supremo Tribunal Federal. O artigo 101 da Constituição diz: O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada. Só isto. Não precisa apresentar diploma de nada e nem prestar concurso, como é exigido para juízes togados. É nomeado pelo presidente da república após aprovação do Senado.

Ninguém em sã consciência pode afirmar que os ministros não têm conhecimentos jurídicos, pois esta é uma das condições para ser nomeado. Nomeado é a palavra chave. Não poderia haver lealdade por parte de alguns ministros a quem os escolheu e nomeou? Espera-se que não. Porque a outra condição é ter reputação ilibada.

Parte dos ministros optou por anular a aplicação da lei para a eleição de 2010 tendo por base a anualidade, em outras palavras, uma lei que altera o processo eleitoral só tem validade se aprovada um ano antes das eleições.

Ao pé da letra é isto. Não pode. O Projeto Ficha Limpa, entretanto, não foi uma iniciativa dos políticos e sim do povo que deseja ser governado por políticos de conduta ilibada, e para isto recolheu mais de um milhão e trezentas mil assinaturas para propor ao Congresso Nacional uma lei de iniciativa popular.

Se a decisão do STF tivesse sido unanime o povo teria que abaixar a cabeça e se conformar com o leite derramado, mas a corte ficou dividida. Metade de um lado metade de outro. Um ministro, togado por sinal, optou pró réu.

Embora sancionada, a Lei Ficha Limpa poderá ter validade para as eleições de 2012. Poderá, porque há processos correndo no STF questionando a constitucionalidade dela e ser anulada em definitivo.

Os ministros não são eleitos pelo povo e sim pelos políticos. Para uma proposta de lei por iniciativa popular precisa de pelo menos 1% de assinaturas dos eleitores. É vontade do povo votar em políticos honrados, tanto é que a Lei Ficha Limpa foi aprovada e sancionada por proposta de mais de um milhão de assinaturas, entretanto onze pessoas poderão jogá-la na lata suja da política brasileira.

domingo, 13 de março de 2011

Deletério

Existem tantas coisas que causam danos, que o espaço de um artigo é muito pequeno. É assunto para um livro, além dos que já foram escritos.

Marqueteiros têm a capacidade profissional de transformar algo ruim e nocivo em bom. Não existe mais publicidade de marcas de cigarro na televisão. Durante décadas o tabaco foi símbolo de homens de sucesso.

Viajava com um amigo no carro cuja marca ele era representante. Quando o carro ultrapassou certa velocidade, o ruído do motor aumentou significativamente. Fiz um comentário dizendo que o ruído era um defeito da marca. A perspicácia do amigo foi ímpar. Disse que não era defeito e sim uma peculiaridade da marca.

Algumas normas e leis brasileiras não são danosas. Elas têm peculiaridades próprias. Visitas íntimas para presidiários e indultos são atos que afrontam a sociedade, mas é tido como algo benéfico para recuperar um bandido. Em outros países presidiários ficam presos.

Já imaginaram se o PROCON recebesse reclamação por leis e normas má elaboradas pelos nossos dirigentes públicos e aplicasse a mesma punição que se aplica a um produto defeituoso e de má qualidade?

É inacreditável, mas o Congresso Nacional pretende realizar uma reforma política. Na verdade esta reforma não causará nenhum benefício à sociedade. Talvez sim. Deputados de partidos pequenos e de esquerda serão eliminados da Câmara. Francisco Everardo Oliveira Silva entra, mas quem conseguiu se eleger pelos votos de sua legenda não. Teoricamente é só isto. Fim do voto proporcional. Estão chamando de voto distrital, onde o distrito é o Estado. São Paulo teria setenta deputados.

Esta suposta reforma vem de encontro com os anseios do povo, que não concorda que um candidato bem votado não consiga se eleger. Outro com menor número de votos consegue. Mesmo com a divulgação da lei eleitoral, a maioria desconhece os critérios da proporcionalidade.

A eleição proporcional para deputados e vereadores favorece partidos pequenos e candidatos sem recursos financeiros. Caso ocorra a reforma, valorosos nomes que não conseguiram se eleger, mesmo tendo expressiva votação, pelo fato do partido não ter conseguido atingir o coeficiente eleitoral serão beneficiados.

Entre um sistema e outro é melhor extinguir o voto proporcional, uma vez que o povo escolhe o candidato e não o partido como querem estabelecer os caciques da política. Que entre o Tiririca e tantos outros, porque a escolha foi do povo. Como o próprio Deputado Francisco Everardo disse: pior do que está não fica.

Ainda não saiu nenhum comentário na imprensa se esta reforma vai atingir o Poder Executivo. Guardada as devidas proporções o presidente e o prefeito depois de eleitos governam como bem estendem. Para eles a lei é um detalhe.

Frase de Mário de Andrade em “Macunaíma” tem a grandeza de um lema: Pouca saúde e muita saúva, os males do Brasil são. A saúde continua precária e é uma responsabilidade direta do chefe do executivo. Seria a saúva uma figura de estilo usada por Mário de Andrade? A figura da saúva não precisa ser exatamente o inseto que quando precisa de alimento sai em fila vai até a sua dispensa pega o que deseja e leva para sua sociedade. Pode ser o seu representante político.

Não é a reforma política que vai causar mal ao Brasil. Nem salvá-lo. Só a reforma íntima de cada pessoa pode mudar o comportamento de nossos políticos. Quem não leu dever ler um artigo de João Ubaldo, onde ele diz que o povo é a fonte de matéria prima das Câmaras.

Por ser prejudicial não é permitido propaganda de fumo na TV, mas propaganda política pode.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Máscara

Carnaval já está chegando. Sábado passado já teve um grito num bar em Birigui. Neste sábado haverá outro. Carnaval é preciso? Talvez nem tanto como navegar foi. Inegavelmente esta festa ultrapassa fronteiras. Fronteiras do comportamento. Momento de usar máscaras. Momento de máscaras caírem.

Quando foi que o mundo descobriu a máscara? Embora a máscara lembre carnaval, sua origem vem de tempos remotos e tinha sentido religioso. Era um adereço para lembrar ou representar uma divindade. Atualmente poucas seitas continuam usando máscaras em seus rituais. No teatro grego e romano os atores usavam máscaras para compor suas personagens. A máscara vem de longe.

Camuflagem é uma máscara que o soldado usa para enfrentar o inimigo ou dele se esconder. Camuflagem não é uma invenção humana. O camaleão se sai muito bem nesta arte. Muda de cor conforme a necessidade. O polvo expele uma secreção escura para fugir de uma situação de perigo frente a um eventual predador. Embora a lula seja parecida com o polvo, não sei se também sabe se camuflar em situação de perigo. O molusco não, já o político homônimo, além de camuflar, soube se blindar, mas a máscara está por cair.

Máscara no carnaval faz lembrar Veneza. Bem diferente da cidade maravilhosa. Por aqui já não existe mais baile à fantasia. A máscara caiu em desuso no carnaval. Na vida real serve para ocultar a verdadeira face. Para o sargento Garcia o Zorro é um bandido. Do ponto de vista da lógica, o raciocínio é lógico. Penso logo existo. Bandido usa máscara, logo Zorro é bandido.

Usando este raciocínio os bailes à fantasia foram proibidos em muitas cidades. Bandidos se infiltravam facilmente no meio da sociedade. Usando este mesmo raciocínio um juiz do nordeste proibiu os motociclistas usarem capacetes. Bons exemplos devem ser copiados. Dos bailes os foliões sentem saudades, mas do capacete acredito que ninguém sentirá falta.

Como se vê o bem e o mal usa máscaras. Seria só na literatura ou na vida real? Fisicamente ou não a maioria das pessoas usa este artifício para obter vantagens ou ocultar verdades.

A máscara do autoritarismo está caindo em alguns países do mundo árabe. Há poucas semanas sob intenso protesto da população o ditador do Egito renunciou. Hosni Mubarak governou com mãos de ferro impondo uma ditadura que duraram trinta anos.

Muammar Gaddafi se equilibra como pode para se manter no poder da Líbia. Cada soberano tem a sua peculiaridade para se perpetuar no poder. Com receio da máscara da ditadura cair, o Soberano da Líbia anunciou que distribuirá dinheiro, cerca de quatrocentos dólares às famílias e também dará aumento nos salários dos funcionários públicos. A imprensa não divulgou a origem destes recursos. Não foi informado se são oriundo de sua fortuna pessoal ou se é dinheiro público.

Se fosse filme, era reprise ou uma refilmagem. Aqui no Brasil o modo de agir é mais camuflado. Em épocas de eleições os votos são comprados tendo como moeda cesta básica, jogo de camisa de futebol acompanhado de pelo menos duas bolas e promessas.

No Egito Mubarak ficou no poder trinta anos. Gaddafi está a mais de quarenta anos. Atrás de uma máscara democrática há oito anos está sendo implantada uma ditadura. Os deputados e senadores votam conforme a vontade do poder executivo. Esta semana foi proposto que o salário mínimo não será mais discutido e aprovado pelo Congresso Nacional e sim um simples decreto da Soberana Presidente.

A população, que sofre as conseqüências de pequenas ditaduras, sente-se impotente para lutar com os desmando dos pequenos ditadores. Os prefeitos não cuidam de suas cidades como deveriam. Ruas esburacadas, hospitais em condições precárias de atendimento, traficantes vendendo drogas. Os pequenos ditadores continuam no poder.