Pequenos
fatos podem significar muito. Trocar nome de rua ou de aeroporto significa
alguma coisa? Talvez sim. Por outro lado pouco importa, mas o fato é que se
perde um pouco da memória. Fica uma lacuna na história.
A
Rua da Misericórdia deveria ser a rua da Santa Casa de Misericórdia. Para que
ninguém esqueça, que naquele local existe misericórdia para com pessoas que
precisam de ajuda médica. Em Birigui a Rua da Misericórdia existia. Não era a
da frente. Ficava no fundo da Santa Casa, dando a impressão, que misericórdia
fosse algo, que causasse dó ou vergonha. Algum político trocou o nome da rua. A
memória se perdeu.
A
primeira Santa Casa de Misericórdia foi criada em Lisboa pela rainha Dona
Leonor, no ano de 1498. O propósito não era somente o tratamento de enfermos.
Cuidava dos idosos, órfãos e dos enjeitados. Alimentava os miseráveis e
enterrava os mortos sem família. O que hoje podemos chamar de moradores de rua.
Miserável
é uma palavra tão forte, que quando a pronunciamos nos faz lembrar do romance
de Victor Hugo. A miséria não é só enredo de romance. Ela existe. Talvez ela
não seja encontrada, tão acentuadamente, em Birigui, porque nossos enfermos
desprovidos de recursos são encaminhados para outros hospitais da região.
Misericórdia é um ato de solidariedade.
Não
há registro na história e nem nos documentos a data de fundação da Santa Casa
de Misericórdia de São Paulo. Acredita-se que tenha sido em 1560. São Paulo
cresceu e a Santa Casa também. Em 1884 ela foi instalada no atual prédio e hoje
é a maior do mundo.
A
Santa Casa de Misericórdia de Birigui também foi criada nos mesmos moldes que a
de São Paulo. Foi construída pelo esforço da Irmandade e do povo. Birigui
cresceu, mas a Santa Casa não. A administração foi subtraída da Irmandade e
concedida a especuladores políticos. E neste status permaneceu por décadas.
Os
propósitos da Irmandade eram uma verdadeira missão. Prover recursos para a
prática da caridade e da misericórdia. Socorrer doentes, inválidos e
desamparados. Uma parte desta missão os políticos ainda não tocaram. Ainda
resta solidariedade ao Recanto do Vovô, Abrigo Vó Tereza e outras entidades.
Entretanto, não aos moldes e princípios da Santa Casa de Misericórdia, criada
pela rainha, implantada em todo o reino de Portugal e que permanece até nossos
dias.
O
povo que é tido como ignorante e sem cultura, que certamente não vai ler este
artigo, não fazem distinção entre Irmandade e Funcionários. A missão da
Irmandade é prover recursos para o funcionamento da Santa Casa. Médicos, enfermeiras
e demais funcionários não são missionários. São profissionais que salvam vidas
e para tal recebem salários, nem sempre justos.
Santa
Casa de Misericórdia não foi criada para enriquecer seus proprietários,
sobretudo porque ela não tem dono. A Prefeitura suspendeu a intervenção. Não
importa quem está à frente desta nova administração. Por fora está ficando uma
bela viola. No saguão lê-se: Santa Casa de Birigui e abaixo Organização Social
de Saúde. Será que os propósitos, que Dona Leonor criou para amparar os
necessitados, não serão observados nesta nova Santa Casa? Certamente a
misericórdia será mantida através do plano de saúde, que o governo,
precariamente, mantém.
É
uma pena. O povo paga devidamente os impostos, mas não recebe os benefícios,
que estes impostos deveriam retornar em forma de bons hospitais, bons colégios
e segurança. Em razão disto, a Santa Casa de Misericórdia precisa continuar a existir.