domingo, 12 de julho de 2009

Apagador

Havia uma figura indescritível: o apagador. Hoje esta personagem não existe mais. Quando o sol anunciava lá no oriente que estava chegando para iluminar o ocidente, o apagador iniciava sua jornada. Apagar os lampiões dos postes da cidade.

Quando o sol estava prestes a terminar sua jornada, para que a cidade não ficasse nas trevas, o apagador invertia sua função. Acendia os lampiões e as ruas ficavam iluminadas. E antes dos primeiros raios do sol, tudo se repetia.

Quando chegou a eletricidade o apagador não perdeu seu emprego. Ele percorria as ruas e com um bastão longo acionava no alto dos postes o interruptor para acender as novas luminárias. Não era mais a gás. Eram lâmpadas incandescentes.

A principal função do apagador não era acender as luminárias porque a treva estava chegando, mas apagá-las porque uma luz maior estava anunciando sua chegada. Uma luz que vem do infinito e trás energia.

Quem é mais importante o professor ou o apagador? Este apagador não é aquele que ilumina ao cair da tarde e apaga ao amanhecer. Ele apaga a frase escrita, mas que não expressou a razão do pensamento do professor. Que apaga quando o aluno não soube somar três mais cinco mais nove. Ambos são importantes. O professor ensina e se houver erro, o apagador é quem oferece a oportunidade de que tudo seja refeito. O professor é como o sol. O sol trás luz. O professor trás conhecimento. O apagador dá suporte a ambos.

O doutor Simão Bacamarte casou-se aos quarenta anos com dona Evarista da Costa Mascarenhas. Ela não era bonita nem simpática. Ele era um médico alienista. Aqueles que cuidam de loucos. Ela era viúva de um juiz-de-fora. Juiz-de-fora era um funcionário da magistratura que substituía o juiz nas suas ausências. Será que ainda existe juiz-de-fora atuando?

A história de Machado de Assis é conhecida por todos. Simão Bacamarte mandou recolher ao hospício quase toda a população. A internação era por motivos, que ele julgava serem atos de loucura.

É uma pena que Machado de Assis não é estudado. Ler é pouco. É preciso estudar sua obra. Analisando sob uma óptica, Bacamarte era alienado, por outro ângulo da visão do comportamento sempre foi alienista. Tanto é que, ele próprio percebendo que nem todos eram alienados, e talvez ele o fosse, prescreveu sua própria internação no hospício. Simão Bacamarte não permitiu que o bom senso fosse apagado de sua vida ilibada.

Há momentos que um apagador deixa nosso raciocínio na maior escuridão. Alguns atos são realizados nestes pequenos instantes. Numa avenida com canteiro central é normal a proibição de conversão à esquerda. Tem motorista que não obedece. É um momento de escuridão ou é um ato de alienado? Aquele louco que dirige todos os dias.

Quando chegam as eleições entra novamente o apagador em cena e parte da população torna-se paciente de Simão Bacamarte. Não ficam internados nem recebem tratamento do doutor alienista. Ignora a ausência da luz que indica o caminho do bom candidato e vota no candidato que fez a melhor campanha. Outra escolha é o candidato que está supostamente na frente das pesquisas.

Infelizmente nosso regime não permite a existem de um apagador para retirar da cena política pessoas, que cometem atos irregulares. “O Estado de São Paulo informa que ao menos R$ 500 mil dos recursos repassados pela Petrobrás para patrocinar um projeto cultural da Fundação Sarney teriam sido desviados para empresas fantasmas e empresas da família Sarney. O dinheiro teria ido parar em contas de empresas com endereços fictícios e contas paralelas. O projeto nunca saiu do papel.”

O atual Presidente da República defendeu o Presidente do Senado dizendo que Sarney não pode ser tratado como uma pessoa comum. Não é este o momento do doutor Simão Bacamarte internar alguns pacientes? Até o senador Suplicy, tido como honesto e de conduta ilibada, defende com veemência a não criação da CPI da Petrobrás. Não precisa ser um alienado para esconder atos ilícitos.

É preciso ser alienista todos os dias. E apagador também. Apagar a luz fraca do lampião e permitir que a luz forte do Sol ilumine o caminho da sabedoria e aqueça os laços fraternos entre todas as pessoas. Sobretudo das pessoas de bons costumes, para que os bons costumes prevaleçam em nossa sociedade.