sábado, 14 de junho de 2008

Pilatos


A boa religião é aquela que não cobra nada de ninguém. Não cobra aprendizado e nem conduta. Em contrapartida, quem adota uma religião deve fidelidade à doutrina e aos costumes por ela postulados. Não precisa pagar o dízimo, mas deve pagar o rateio das despesas decorrentes do funcionamento. É provável que um número significativo de cristãos não conheçam o cristianismo. É um contra-senso.

Todo homem deve ter ao seu lado uma adorável mulher. Pilatos tinha. Naquele tumulto em que o povo queria crucificar um e soltar o outro, ela mandou um bilhetinho para o marido: “Nada faça a este justo.”. E ele nada fez. Num ato simbólico pediu uma bacia com água. Lavou as mãos e as enxugou e disse: “Sou inocente do sangue deste homem. Isto é lá convosco!”.

A atitude de Pilatos é tida como covarde e omissa. Covarde porque não tomou a decisão de inocentar Jesus. Omissa por inocentar-se do ato. É possível olhar esta atitude por outra óptica. O povo queria a libertação de Barrabás e a condenação de Jesus. Pilatos concedeu ao povo o direito de optar. Por um ou por outro. O eleito foi um bandido.

Os Romanos, embora soberbos, tinham o péssimo hábito de serem democráticos. Democráticos no sentido de conceder ao povo subjugado o direito de viver seus próprios costumes. Tomar suas próprias decisões. Os judeus não queriam Jesus. A morte de Jesus favoreceu a quem? Aos romanos ou aos judeus?

Daquele julgamento para cá a única modificação aparente é a evolução tecnológica. Os julgamentos continuam da mesma forma. Basta levar ao povo o poder de decisão.

Eleição é um destes casos de julgamento dos tempos atuais. Concorrem às eleições dois tipos de candidatos. Alguns puros. Puros porque sobre eles não recaem nenhuma mácula. São candidatos de conduta social ilibada e comportamento de retidão.

Outros o oposto. São candidatos que, de um modo subjetivo, mantém um programa de publicidade em torno de seu nome durante o tempo todo. O propósito é evidenciar seu nome para uma futura campanha política. Como é subjetivo pode passar despercebido, mas pode ser enquadrado como crime eleitoral. Publicidade fora do período legal. Tem sido uma tradição neste julgamento, o vencedor raramente é o melhor candidato e sim o que fez a melhor campanha.

Os candidatos à reeleição estão entre os que mais se utilizam desta prática. Uma afronta maior ao cidadão de bons costumes é o caso de candidatos condenados pela Justiça, por irregularidade administrativa, poderem concorrem às eleições como se nada tivesse acontecido.

Se Pilatos fosse julgar qual cidadão poderia ser candidato, escolheria os puros? Para não modificar a parábola, Pilatos lavaria as mãos, concedendo ao povo a responsabilidade de julgar.

A Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público contra José Genoíno e Antônio Palocci por formação de quadrilha, mas foram absolvidos pelo povo, que os conduziram à Câmara dos Deputados. O Ministério Público ainda não conseguiu responsabilizar o Presidente da República sobre as denúncias que a imprensa apontou, que recaíram em José Genoíno e Antônio Palocci.


Mesmo com todos estes escândalos no governo o povo julgou e reconduziu o Presidente da República para o trono de seu segundo mandato. Foi reeleito porque os Barrabás dos tempos modernos sabem conduzir o povo.

Se houvesse a possibilidade de uma terceira reeleição, o prefeito de Araçatuba sairia vitorioso novamente, mesmo tendo sido processado e condenado em seu primeiro mandato.

Qual seria a razão deste comportamento coletivo pela escolha de pessoas que respondem processos na Justiça, por terem cometidos atos não permitidos pela legislação? Seria a projeção de suas próprias ambições?

Pôncio Pilatos era o prefeito daquela região. Sua conduta não era ilibada. Tão pouco tinha um comportamento de retidão. Ele tinha o costume de fazer negócios fora da administração romana, para tirar proveito para si. Será que é um feitiço que acompanha os prefeitos?

Talvez seja esta a explicação deste comportamento coletivo. Melhor é não lavar as mãos e julgar corretamente, para não ser o prefeito da província romana da Judéia de nossos dias.
Benute Santos

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